Isto
está difícil e faz-se o que se pode para se conseguir um emprego, mas todos os
dias se sente culpado por ter declarado que sabia falar islandês. O seu pai,
turista ou marinheiro, esteve em Portugal o tempo suficiente para seduzir-lhe a
mãe e deixar-lhe o bebé na barriga. Aperfilhou-o, mas nunca houve qualquer
contacto, em pessoa ou por escrito. Há dois anos comunicaram-lhe a sua morte.
Concordou que doassem a roupa e recebeu pelo correio os seus únicos haveres, um
relógio velho e um livro em islandês, a bíblia, com o carimbo de um hotel.
Quando afirmou que além do inglês, sabia islandês, tendo um pai islandês, todos
acreditaram. Tanto mais que era alourado (saía nisso à mãe, sobre o pai também
aqui as versões da mãe se confundem, louro ou grisalho).
Ficou
com o emprego: recepcionista no Star Hotel, no turno da noite.
Naquela
semana a expectativa tinha sido grande pela chegada do grupo Steal Stone, a
mais famosa banda de rock do mundo, como foi amplamente noticiado.
Reservaram
todo o 6º andar com a prévia exigência que todos os quartos tivessem mobiliário
branco e garrafas de água Perrier - ele e dois colegas andaram a carregar sofás
e a pintar armários.
Tinham
chegado de tarde e não os viu. O concerto seria no dia seguinte e estariam a
recuperar do voo e da diferença horária.
Esperava
ter uma noite tranquila – já tinham sido avisados pelo gerente da importância
dos hóspedes e “nem pensar em pedirem autógrafos ou selfies!”.
No
entanto, pelas três da manhã tocou o telefone e era o líder, Roger Steal a
gritar algo que lhe soou como: ” I’ want a portuguese stripper singer”.
Apelando
para os seus conhecimentos de inglês e agradecendo a todos os santos, mais uma
vez, que a banda, e nenhum hóspede até à data falasse islandês, lembrou-se da
sua prima Gracinha que cantava num rancho. Tinha um pouco de buço, mas àquela
hora, talvez passasse. Não se recordava era do quereria dizer “stripper”.
Ligou
para a prima que acedeu a vir com dois elementos do rancho.
Quando
chegaram, a prima um pouco mais gorda, todos vestidos com roupas regionais, levou‑os
ao quarto principal.
Estava
muito barulho e não o deixaram entrar.
Nem
meia hora depois, passavam por ele a correr a prima e os elementos do grupo,
afogueados e meios despidos.
Ainda
hoje a prima não lhe fala.
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