Restava
a Clara olhar para o seu filho enquanto dormia, às vezes em ligeiros
sobressaltos pelos sonhos que atravessava. Clara vigiava que não fosse um
pesadelo, mas nunca era. Não raro, logo a seguir sorria. O que veria nos sonhos
o seu menino?
No
quarto, somente a pequena luz de presença perto do cama. Lá fora, ruas vazias e
escuras e um silêncio pesado.
Não
conseguia dormir, não enquanto aquela angústia a oprimia. Estaria o Rafael bem?
Será que iria voltar?
Tinham-se
zangado de novo.
As discussões pioraram desde que tivera o
filho. Não queriam gritar à sua frente e era em vozes baixas que se agrediam.
Depois o Rafael saía, deixava-a a tentar
perceber porque é que reincidiam, porque é que de cada pequena divergência
faziam um bicho-de-sete-cabeças.
Antes
reconciliavam-se na cama, agora não havia perdão.
Até
àquele dia o Rafael tinha regressado, poucas horas depois, a meio da noite. Ela
deitava-se e fingia que dormia. Ouvia-o a despir-se sem acender a luz e a
deitar-se ao seu lado. Trazia consigo o frio da noite. Ela gostava de pensar
que da mesma forma chegaria até ele na cama o calor do seu corpo, e só então
adormecia.
Na
manhã seguinte poderiam nem chegar a trocar nenhuma palavra. Ele iria sair para
o trabalho. Ela, enquanto cuidava do bebé, tentaria agir como se tudo estivesse
bem. Talvez procurasse uma razão ou um plano para se entenderem melhor, mas já
não acreditava que existissem.
Cada
vez esperava e temia que fosse a última, que ele não voltasse, que depois se
seguisse a separação, dor e acalmia, a definição e ponto final, mas imaginá-lo,
dilacerava-a.
Ouviu
o elevador e deitou-se. Seguiram-se os ruídos da chave na fechadura e da porta
a abrir. Era ele.
E
até à próxima discussão nada mais restava.
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