domingo, 24 de julho de 2016

8/8 - Maria e Luis

“…Durante anos - e anos - bebemos goles de bom senso - pequenas doses - durante todo o enorme dia - goles que engolimos sem pensar - não paramos - e - o tempo corre - os anos passam - e acabamos por comprar garrafas de vidro fosco - imensas - inundadas num líquido incolor - ao qual chamamos bom senso - e nas pequenas doses de bom senso que nos obrigamos a tomar - vamos construindo um senso comum - que nos tranquiliza…”
Houve um tempo em que acreditou que poderia mudar o mundo. Tinha observado o que se passava em seu redor e decidido o que queria e o que não queria para a sua vida. Apaixonou-se, sonhou ter filhos, uma família e casou. Começou então um período de turbulência. Ela parecia sempre insatisfeita. Não conseguiam conversar, ela não se abria, acusava-o de não a compreender, embora ele tentasse.  Quando pensava que tinham falhado, ela anunciou-lhe que estava grávida. Sentiu de novo esperança, mas ela parecia zangada. O nascimento do seu filho, não os juntou. Ela continuou sempre a trabalhar, teve um esgotamento e deixou-os. Mais do que a si, sentiu o abandono do filho. Esforçou-se e conseguiu que voltassem os hábitos tranquilizadores.
Deixou que o bom senso o guiasse. De manhã, chegava a ama, Maria. Ele saía para o trabalho. Quando regressava ao reencontro do filho, Diogo, também encontrava a Maria. Conversavam. Com ela era fácil falar, via o Diogo feliz, sentia-se em família.
Até que um dia de novo irrompeu na sua vida o inesperado. O Diogo adoeceu, com febres altas. Viu o filho pequenino com convulsões. Ele e a Maria levaram-no para a banheira, depois para o Hospital. Viu nela uma preocupação e um amor iguais aos seus. Quando o Diogo melhorou e puderam trazê-lo para casa, o menino ao colo da Maria, pensou que quem os visse, veria neles um casal com um filho.

Ocupada nos seus afazeres não o notou logo. Foi reparando que o Diogo estava quieto de mais. Ao invés de brincar com os seus carrinhos e palrar com ela para lhe chamar a atenção, estava prostrado e caladinho. Quando lhe sentiu a testa estava demasiado quente Felizmente nessa altura chegou o Luís. Foram medir-lhe a temperatura que continuava a subir. Ele ligou para o médico, ela para a sua mãe, para que fosse buscar a Ana à escola e lhe tomasse conta dos filhos. Levaram o menino para a banheira para tentar em vão que a temperatura descesse e o Luís decidiu que iam era já para o Hospital. Seguiram para lá os três. Quando chegaram, puseram lá o menino a soro, tiraram-lhe sangue e deram-lhe um antibiótico. Nenhum dos dois dormiu, velaram pelo menino sentados na cama e numa cadeira. Rezou para si pelo seu filho do coração. Quando o Diogo melhorou sentiu-se agraciada. Regressaram a casa os três.

Deitaram o menino na sua caminha. Lá fora, começava o dia. Os dois, muito perto um do outro, viram o menino adormecer. Depois ele passou um braço à volta dos seus ombros, ela encostou-se a ele e beijaram-se. Souberam os dois que era certo e estavam juntos, nas pequenas e nas grandes coisas, eram uma família.


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