domingo, 24 de julho de 2016

Viagem de camionete

"Eu sei que ele não me trata bem, mas que quer, é dele que eu gosto."
Não resistiu a olhar para as duas mulheres atrás de si. Seguiam os três naquela camionete desde há vinte minutos ou três paragens. Já lá estavam as duas quando entrara, mas na altura não as vira. Sentara-se mesmo à sua frente. Começara sem querer a escutar o que diziam. Falava sobretudo a mais nova. A outra, já de idade, só de vez em quando tecia alguma pergunta ou comentário: "e ele?", "vê lá a tua vida" e "o destino está traçado". A mais nova falava da sua vida, mas parecia um romance de capa e espada. Vivera com um homem que a maltratava e já a enganara com outras. Entretanto, aparecera um que lhe dava tudo o que ela queria. Pois, mas ela queria o outro. E agora que o outro lhe fizera um sinal, deixava o bonzinho pelo marialva. Quando o mais disfarçadamente que conseguia, olhou para trás, ficou surpreendido. Não era uma rapariga, quando muito uma mulher jovem e não era de todo bonita. Não parecia a heroína da história que contava. Que o marialva a quisesse e entre outras ainda admitia, mas porque raio a quereria o outro? O bonzinho que era trabalhador e lhe dava tudo, aceitava o seu passado e só não queria que ela o deixasse. Se não fosse pela credibilidade conferida pela idade da sua interlocutora, facilmente imaginaria que era uma maluquinha, a inventar que todos os homens a queriam.

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